Benefícios para Autistas em seu desenvolvimento através da Dança


Se a dança é capaz de incluir todo tipo de pessoa, como seria sua presença na vida de crianças, adolescentes e, por que não, adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA)?
É crescente o interesse nas pesquisas relacionadas ao TEA, principalmente no que se refere ao seu funcionamento e desenvolvimento. Embora exista essa busca por um conhecimento mais profundo relacionado às suas causas ou as diferenças anatômicas, por exemplo, muitos são os mistérios que envolvem essa “diferente” condição humana.

Em comparação ao ano de 1943, quando foi descrito pela primeira vez, atualmente, se sabe muito mais sobre o TEA e as características principais dos portadores. Embora exista a necessidade de preencher lacunas, hoje, o acompanhamento e tratamento deste transtorno possibilita, principalmente quando diagnosticado precocemente, que se chegue o mais perto de um percurso de vida considerado normal pela ciência e estudiosos da área da saúde, de maneira que seja possível um desenvolvimento saudável, íntegro e, até mesmo, com grande diminuição de dificuldades características e específicas do TEA, através de uma rede de acompanhamento profissional e multidisciplinar.

Partindo do pressuposto de que tudo ao ser humano é aprendido, é possível pensar em contextos favoráveis onde a aprendizagem e o desenvolvimento de diversas habilidades seja possível de maneira ampla, e aqui podemos incluir a dança como um ambiente fundamental para um desenvolvimento global do indivíduo com TEA.

Nós, amantes da dança e da arte como um todo, sabemos os grandes benefícios que ela pode nos proporcionar a curto, médio e longo prazo. Porém, ao longo dos anos, mudanças sociais a transformaram de algo que era exaltado séculos atrás, a uma prática que, hoje, é considerada por muitos banal. No entanto, as recentes pesquisas e esforços de estudiosos e cientistas têm demonstrado que sua prática vai além de um auxílio para emagrecer ou tonificar músculos. A dança possibilita a evolução de outras capacidades, muitas vezes desconsideradas em nosso cotidiano, nos campos social, comportamental, psicológico, emocional e, claro, físico.

O processo de desenvolvimento saudável só é possível num ambiente em que cada ser humano tem a possibilidade de construir sua própria existência em meios físicos e sociais recíprocos a sua presença e ação. Quanto mais cedo ocorre o envolvimento da criança em situações sociais, maior a quantidade e qualidade dos benefícios adquiridos através dessas interações, pois as experiências e aprendizagens são consequências delas. Neste sentido, sabemos que uma das maiores dificuldades presentes na vida dos autistas está relacionada exatamente com as interações sociais e a comunicação. Desta forma, o contato físico e social que a dança possibilita traz experiências importantes que auxiliam nessas dificuldades sociais.

Na antiguidade, a dança era a principal fonte de comunicação, expressão e interação dos homens com seu meio e seu grupo. Ou seja, mesmo em sua composição mais primitiva, já denotava a sua eficiência em comunicar ou representar algo, em estimular a interação e participação de maneira inclusiva de um grupo social. Estas características nos levam a considerar a dança como fator de grande significância e necessidade para as crianças autistas, aumentando as capacidades de socialização e da maneira de se comunicar.

Cognitivamente a dança contribui muito para o desenvolvimento humano, pela presença de várias conexões neurais que são requisitadas e necessárias para a elaboração, produção e execução de movimentos. Capacidades e habilidades como atenção, concentração e memorização, são amplamente estimuladas com a prática da dança, além, é claro, de maior qualidade no desenvolvimento das chamadas múltiplas inteligências (teoria sobre o conjunto de habilidades que compreendem oito tipos de inteligências diferentes: Linguística, Lógico-matemática, Espacial, Corporal-cinestésica, Interpessoal, Intrapessoal, Naturalística e Musical).

No que se refere ao fator psicomotor ou neuropsicomotor, é interessante ressaltar que estes possuem ampla relação tanto com o aspecto social e de interação, como com o cognitivo e emocional.

Ao realizar uma coreografia ou sequência coreográfica, por exemplo, surge a possibilidade de desenvolver aspectos próprios da experiência psicomotora como ritmo, flexibilidade, lateralidade, noção de corpo, coordenação, equilíbrio, orientação espacial, tonicidade, expressividade, a própria cognição, afetividade, autonomia, etc, extremamente necessários para o desenvolvimento do autista que pode, por vezes, apresentar atrasos em sua evolução. Isso significa que a estimulação específica nessa área possibilita um avanço psicomotor importante. Este desenvolvimento psicomotor é de extrema importância, principalmente nas primeiras fases do crescimento humano, uma vez que toda a aprendizagem obtida nessa fase, especialmente a motora, irá influenciar significativamente no futuro deste indivíduo.

Atrelado a isso, estudos mostram que a psicomotricidade tem como ponto de partida o desenvolvimento psicológico da criança, na medida em que acompanha as leis do amadurecimento do sistema nervoso. Além disso, a utilização da ludicidade facilita a estimulação da imaginação e criatividade, bem como a vivência de papeis sociais. Importante ressaltar que o teor lúdico da dança infantil, traz a experiência de inventar e se reinventar a todo instante.

É preciso entender a criança com TEA como ser humano passível de múltiplas aprendizagens novas e não somente uma reprodutora de comportamentos estereotipados, uma real exploradora do mundo e da sociedade em que está inserida. O brincar dentro da dança, sem distinções no que diz respeito a “normais” ou patológicas, contribui para o crescimento da criança com TEA, sua aprendizagem e a construção do seu ser para a vida futura.

Outra questão relevante na prática da dança para autistas é a possibilidade de estimulação do processamento sensorial, que é uma dificuldade para os portadores deste transtorno. Isto se dá através da musicalização e de comandos e objetos utilizados em aula para promover o ensinamento e aprendizagem dos movimentos e, até mesmo, comportamentos sociais. Sabe-se, por exemplo, que a música presente nas aulas pode auxiliar no aumento do repertório da linguagem falada, uma vez que recentes pesquisas têm demonstrado uma aproximação das áreas cerebrais responsáveis.

Portanto, a dança na infância para autistas, pode ser considerada como fator contribuinte e, em muitos casos, determinante, para o desenvolvimento social, cognitivo, psicológico, comportamental e motor destas crianças. De início, a relação entre professor e aluno não é fácil, seria uma utopia afirmar o contrário, mas assim como todas as crianças, os autistas precisam de tempo para compreender as regras sociais e o funcionamento das aulas de dança. O professor precisa de paciência e, o mais importante, conhecimento, para proporcionar ao seu aluno autista aprendizagem e desenvolvimento, garantindo assim que suas aulas de dança e a prática da mesma sejam uma contribuição significativa para sua vida no futuro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


GONÇALVEZ, E. C. A Psicomotricidade e a Dança – a visão dos professores de dança de uma escola particular do município de Fortaleza. Universidade de Brasília, Fortaleza 2007;
LUSSAC, R. P. M. Psicomotricidade: história, desenvolvimento, conceitos, definições e intervenção profissional. Revista digital efdeportes, novembro de 2008;
GRANDIN, T.; PANEK, R. O Cérebro Autista: pensando através do espectro. Tradução de Cristina Cavalcanti. 4ª Ed. Editora Record – Rio de Janeiro/São Paulo, 2016.

Fonte: Alessandra de Freitas | Dança em Pauta


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